domingo, janeiro 30, 2005

Esta semana:

Maurício Negão - Todos os versos (2004) *



A música independente tem, devido a sua grande possibilidade de experimentação, a oportunidade de nos surpreender. Na verdade, este deveria ser o grande objetivo de todos os que se envolvem com música, mesmo que estejam presos nas amarras das grandes gravadoras: experimentar, testar, misturar, emocionar. Maurício Negão, este carioca que além de músico também é artista plástico, captou tão bem esta idéia que em "Todos os Versos", seu quinto álbum, mostra que mesmo o pop, em toda sua abrangência, ainda pode ser misturado ou experimentado. Isto já havia acontecido em "Criolina", de 2001, é verdade. Mas em "Todos os versos", além de provar todas aquelas coisas sobre o pop, ainda faz mais: ele prova que o pop ainda pode surpreender.

A característica mais importante deste novo trabalho de Maurício Negão é que todas as misturas feitas ao longo do álbum se mostram naturais. Por exemplo, Jorge Ben Jor e Jimi Hendrix são duas influências claras no som de Negão, e mesmo parecendo água e óleo, estas duas vertentes musicais convivem em plena harmonia em faixas como "Você e eu" e "Alô alô". Ou seja, lançando mão da livre possibilidade de experimentar, "Todos os versos" é o casamento ideal entre as mais diversas possibilidades de pop. Seria perigoso rotular de maneira muito objetiva a inventividade deste carioca, mas o rock-ziriguidum, o auto-intitulado estilo de Maurício Negão, talvez seja a melhor maneira de resumir em duas palavras a linha que orienta o músico.

A gama de influências que constituem "Todos os versos" é tamanha e tão variada que acaba fazendo do álbum um apanhado geral de músicas que aparentemente não possuem ligação entre si. Em alguns casos esta é uma característica negativa, pois um mesmo disco acaba soando como uma coletânea de diversos artistas diferentes, não expondo a identidade músical de seu autor. No caso de Maurício Negão, as canções, mesmo sendo independentes entre si, são auto-sustentáveis, contendo algo do músico, o que acaba fazendo do disco uma colagem de pequenas peças que não precisam, necessariamente, uma da outra. Mas, em momento algum, temos a impressão de termos vários artistas diferentes; ao contrário, vemos um mesmo artista mostrando suas mais variadas facetas.

Neste sentido, convivem pacificamente no mesmo álbum músicas como "Lindos dias" - uma balada com violões e sem muitas surpresas, mas que vale por sua delicadeza, não apenas nos arranjos, também nas letras -, e "Moça bonita" - na qual o peso das guitarras dá os parâmetros de toda a música. Isto sem levar em conta canções como "A Marcação" - uma balada eletrônica que facilmente estaria em "Falange Canibal", de Lenine -, "Qualquer lugar" - segunda parceria de Maurício Negão com Frejat que, talvez por causa disso, guarda em si muito da sonoridade típica dos anos oitenta - ou "Alô alô" - riffs de guitarra na melhor interpretação tupiniquim de Hendrix.

Figuras como George Harrison ("Lindos dias"), Jorge Ben Jor ("Você e eu"), Jimi Hendrix ("Alô Alô") e qualquer banda pop brasileira dos anos oitenta são presenças confirmadas em "Todos os versos". É claro, todas juntas, misturadas num grande liquidificador musical que também atende por Maurício Negão, e levemente temperadas com a modernidade, que dá o toque final neste trabalho. A música não deve seguir receitas, principalmente no que diz respeito ao mundo independente, afinal, é a coragem de experimentação que diferencia os bons e os maus músicos. Entretanto, se me fosse pedido algum exemplo do como deveria ser feito um som original, essencialmente brasileiro e de qualidade, minha primeira indicação seria "Todos os versos".

*Resenha publicada no site Poppy Corn

quarta-feira, janeiro 26, 2005

Extra:

Nirvana - Incesticide (1992)



O Nirvana já estava em todas as paradas, capas de revistas e canais de televisão possíveis quando foi lançada a coletânea "Incesticide", em dezembro de 1992. Após o estrondoso sucesso de "Nevermind", a idéia de manter a banda sob os holofotes era perseguida obsessivamente pelos executivos da Geffen, gravadora do grupo. A lógica comercial era bem simples: até sair um novo álbum de inéditas, era necessário que o Nirvana continuasse com as paradas, revistas e televisão. Ou seja, nada de novo se pensarmos através das cartolas das grandes gravadoras, que dificilmente trazem ao mundo idéias que não escondem alguns cifrões por trás. De certa maneira, nada errado, mas o problema é que poucas vezes estas idéias trazem algo realmente interessante ao público. Talvez "Incesticide" seja uma das exceções a está regra, mas ela não foi sem querer.

A primeira investida neste sentido foi um EP com seis faixas chamado "Hormoaning", lançado apenas na Austrália e Japão em Janeiro de 1992. Com a desculpa de promover a turnê australiana da banda (e, posteriormente, a turnê japonesa), "Hormoaning" foi item de briga entre colecionadores, pois além de trazer o lado b do single de "Smells Like Teen Spirit", "Even in his youth", havia ainda a inédita "Aneurysm" e quatro covers: "Turnaround" da banda Devo, "D-7", do Wipers, além de "Son of a gun" e "Molly's lips", do Vaselines, todas gravadas no lendário programa de John Peel, na emissora britânica BBC. Ou seja, a fórmula para manter a banda em evidência funcionava, principalmente se envolvesse sobras de estúdio e covers inusitadas, acontece que a Geffen se deparou com um problema: não havia material suficiente para preencher um álbum inteiro.

Então, num acordo com a Sub Pop, primeira gravadora do Nirvana e possuidora de fitas demos de 1988 a 1990, "Incesticide" foi lançado para alegria de fãs e colecionadores e cartolas. Admirador de música como qualquer um de seus fãs, Cobain fez questão de fazer parte deste projeto, não apenas selecionando algumas músicas, como também pintando a capa do disco e emprestando seu patinho de borracha para a fotografia da contracapa. "Incesticide", além de algumas canções de "Hormoaning", possui muita coisa das demos de 1988, como "Downer" - a primeira e única música da banda de cunho diretamente político, que fez parte apenas da versão em CD do disco "Bleach" -, "Mexican Seafood", "Hairspray Queen", "Aero Zeppelin" e "Big Long Now", sendo algumas destas sobras do que se tornou "Bleach", primeiro disco da banda. Reza a lenda que estas sobras seriam o próprio “Bleach”, mas semanas antes de gravá-lo, a banda se empolgou tanto que fizeram muitas novas músicas, acabando por descartar as que já estavam prontas.

As covers do Devo, Wipers e Vaselines que constavam em "Hormoaning" voltaram a aparecer neste disco, sendo as únicas covers que compõe a tracklist de "Incesticide". Uma pena, afinal, há ótimas músicas de outras bandas tocadas pelo Nirvana nos mais variados bootlegs perdidos mundo à fora. Por exemplo, "Do you love?", do Kiss, ou mesmo a ótima "The Priest they Called Him", um conto de Willian S. Burroughs (isso mesmo, aquele beatnik), lido pelo próprio, com fundo musical altamente distorcido feito pelo Nirvana. Aí está duas dicas para que gostar de desencavar raridades. Mas não pense que se as covers pararam por ali o disco também acaba. Na verdade, logo na primeira faixa encontramos "Dive", que além de fazer parte de uma coletânea lançada pela Sub Pop em 1990 com a bobinha "Sliver" (também presente neste disco), é uma das canções mais cruas da banda. Para Cobain, “Dive” só não entrou em Nevermind pois já havia saído na tal coletânea. Difícil acreditar, pois a rispidez desta música passa longe das músicas do maior sucesso da banda.

"Incesticide" mostra, a exemplo de "Dive", um Nirvana que ainda experimentava bastante, variando entre momentos ora cru e pesado, ora estranho e dado a experimentações que passam longe da imagem construída pela banda até o fim de sua carreira. Estas características ficam explícitas pelo fato de muitas das músicas que constam neste disco serem sobras de estúdio tanto do primeiro quanto do segundo disco da banda, e não por acaso encontramos certas proximidades entre algumas composições. "Stain" é uma destas. Além de ser percebido nela uma crueza que passa longe de Nevermind, é possível ainda encontrar uma banda que ainda tateava os rumos que seguiria, usando riffs de guitarras com um pé no metal de Black Sabbath, mas já se utilizando não só de uma estrutura musical diferente, mas, principalmente, com temáticas diferentes. Além disso, "Stain" pode ser considerada parente próxima de "Negative Creep", pois cria uma imagem pessimista no desenrolar do que é cantado. Seguindo este rumo há "Beeswax" ou mesmo a estranhíssima "Hairspray Queen" - nesta encontramos as tais experimentações que nunca mais foram vistas no som da banda de Seatlle.

Um fato é verdadeiro no que diz respeito a este disco: para quem é fã, vale tê-lo ali na estante, ao lado dos demais discos da banda. Agora, caso o Nirvana se resuma a algumas canções como "Polly" ou "Come as you are", talvez este trabalho não seja a melhor maneira de conhecer a banda. Entretanto, existem músicas que agradarão a qualquer quase-fã: "(New Wave) Polly" - versão aceleradíssima, com guitarras e bateria -, "Son of a gun" - que além de ser uma cover, é uma singela canção de amor a base de distorções e microfonias -, e "Aneurysm" - uma das melhores composição do Nirvana, que abusa de vocais gritados e andamentos variados, registrando uma das baterias mais inspiradas de Dave Grohl (a versão que aparece no single de "Smells like..." e no EP "Hormoaning" é outra, gravada no começo de 1991. A que consta em "Incesticide" foi gravada no final de 1991, para o programa do também (famoso) radialista Mark Goodier).

Ou seja, é um disco que vale e não vale a pena. Depende de você.

Maquinário pela internet

* Saiu no Dying Days uma resenha do disco "The Covers Record", da Cat Power. É só clicar aqui;

* O Guia de Rock colocou uma pequena apresentação e um link para o Maquinário na seção "Blogs". Fica aqui meus agradecimentos ao Anderson, responsável pelo site.

domingo, janeiro 23, 2005

Esta semana:

Gram - Gram (2004)



Quando uma banda ou um artista traz um certo tipo de inovação ao seu meio, conseqüentemente vemos surgir milhares de seguidores, admiradores ou mesmo plagiadores. Nada mal, afinal, é assim que funciona o sistema, e sempre há entre esses seguidores alguém capaz de partir da mesma base, mas traçar caminhos diferentes. Quando, em 1999, o Los Hermanos encheu a paciência de todos com a tal de "Anna Júlia" foram poucos que viram ali algo novo. Um pop direto, já visto e revisto milhares de vezes, nos quatro continentes. Entretanto, quando eles resolveram lançar "O Bloco do eu Sozinho" e "Ventura", a coisa começou a mudar. A partir deste momento eles se tornaram a banda que trouxe a inovação, e não sem tempo começaram a pipocar seguidores Brasil à fora.

Ainda há de aparecer muitas bandas que não fazem mais do que copiar o que ouvimos das barbas de Camelo e Amarante, assim como também irão surgir aqueles que, de alguma maneira, buscarão outras possibilidades, mesmo que a princípio sua base tenha sido a banda carioca Los Hermanos - à partir do segundo disco, é claro. Na verdade, estes que "irão surgir" já começam a despontar no cenário nacional, e um dos nomes que caem com uma luva aqui é o Gram, banda paulista formada por Sérgio Guilherme Filho (voz, guitarra, piano), Luiz Ribalta (guitarra, voz), Marcello Pagotto (baixo, sintetizador, voz), Marco Loschiavo (guitarra) e Fernando Falvo (bateria) em 2002. Mesmo que exista ali muita coisa que pode-se classificar como influência de Los Hermanos, a diferenciação básica entre estas bandas - e o que faz o Gram entrar no hall das bandas que seguem caminhos alternativos ao que já existe - é que o Gram possui influências de Beatles e rock inglês de uma maneira geral, enquanto a matéria-prima dos Hermanos é o samba.

Não sem querer os Beatles entram nas influências do Gram. Antes de formar a banda, Sérgio Filho e Marcello Pagotto faziam parte de uma banda cover chamada "The Beatless" que, entre outras façanhas, tocou no Cavern Club, aquele mesmo onde o Fab4 começou a carreira. Algum tempo depois, o "Beatless" deu lugar ao "Movsa", na qual, agora com o guitarrista Luiz Ribalta, o intuito era composições próprias cantadas em inglês. A banda chegou a lançar um disco no exterior, mais precisamente em Liverpool, mas não vingou, fato que gerou uma reformulação na proposta do Mosva. A primeira resolução foi, sem dúvida, cantar em português; a segunda, mudar o nome da banda. A escolha do no GRAM foi devido apenas a sua sonoridade, não significando nada em português (segundo a própria banda, em alemão, Gram significa tristeza, desilusão, mas a escolha foi antes desta informação ser descoberta).

Destas resoluções nasceu, então, "Gram", o primeiro disco da banda que, depois de conquistar Kid Vinil, chegou a gravadora Deckdisc que não teve muito trabalho - afinal, o disco estava pronto -, cuidando apenas da distribuição e divulgação do trabalho da banda paulista que não demorou a ser considerada uma das melhores do mercado independente. Tudo ficou mais fácil ainda com o clipe praticamente caseiro feito pela própria banda para a canção que abre o disco, "Você pode ir na janela". A história do gatinho - que é meio que símbolo da banda - que se apaixona pela gatinha e tira seis de suas sete vidas, mas depois se desilude, é capaz de agradar desde seu sobrinho de oito anos até sua avó. Ou seja, "Gram" agarrou um público sedento por coisas novas de maneira certeira.

O rock britânico é a tônica deste trabalho, e talvez por isso agrade tanto com seu som leve, letras ora tristes, ora mais tristes ainda e arranjos pop infalíveis. As guitarras do Coldplay são facilmente encontradas em faixas como "Sonho bom" e "Moonshine" - sendo está espólio do Mosva, por isso cantada em inglês; as lições pop ensinadas pelos Beatles percorrem todo este disco, mas se mostram agudas nas faixas "Quase ilusão" e "Sonho bom". Cruzando o Atlântico e aportando nas terras do tio Sam, encontramos Weezer nos primeiros momentos de "Quase ilusão" e Radiohead em "Vem Você"; e descendo a América até o Rio de Janeiro, vemos Los Hermanos não apenas na composição das letras, mas em canções como "Você pode ir na janela", "Vem você" - estas no estilo, tanto de cantar como de compor, de Amarante -, "Seu troféu" e "Reinvento" - pendendo mais a Marcelo Camelo.

Mas é claro que estes nomes todos servem apenas como referência. A mais interessante (e diferencial) característica do Gram em relação as outras dezenas de bandas novas é exatamente partir de pontos já descobertos ou inventados por outros artistas e criar sua própria personalidade, mesmo que esta conte com nomes universais como os Beatles. E vale lembrar, um bom álbum de estréia rende bons frutos, mas deixa a expectativa para o próximo. Entretanto, é cedo para pensar nisso, a escada é longa e nada melhor do que um passo de cada vez. "Gram" está aí, e ainda há muitos degraus a subir.

quarta-feira, janeiro 19, 2005

Extra:

Nirvana - Nevermind (1991)



Se fossemos nos prender a números, o mais certeiro deles seria o número 10. Há dez anos, Kurt Cobain, o vocalista e guitarrista do Nirvana, foi encontrado morto em sua casa, na zona residencial de Seatlle; "Nevermind", o segundo e mais importante disco da banda já tem mais de dez anos, e ainda assim é capaz de vender cópias e mais cópias; falando nisso, até hoje, este disco já vendeu mais de 10 milhões de cópias ao redor do mundo; e a nota de dez entre dez fãs da banda a este disco não seria menor que dez. Isto se fossemos nos prender a números, mas não vamos. Falar sobre "Nevermind" é falar sobre quase toda uma cultura, um período onde foram colocados em xeque alguns valores comportamentais e algumas angústias reprimidas por "Thriller" ou "Like a virgin" que atormentavam as rádios, dia e noite.

Não há como negar o impacto causado pelo Nirvana quando lançou seu segundo álbum, o primeiro por uma grande gravadora. O hard-rock já havia se tornado uma paródia de si mesmo, e aqueles cabelões enormes ao lado de solos de guitarras enormes e dos enormes falsetes deixavam de inovar, caindo na mesmice. E o Axl Rose... Bom, o Axl Rose sempre foi o Axl Rose. O início das pré-produzidas 'boybands' que viriam assombrar o mercado em meados da década de 1990 já apontava dois nomes certos: Madonna e Michael Jackson. Suas danças ensaiadas e as músicas vergonhosamente pop marcaram seu lugar no universo musical, porém chegaram a tal ponto de estagnação que mesmo que não quisesse, o mercado precisava de sangue novo. Mas onde encontrar? Uma nova Madonna ou um novo Michael Jackson não seria a solução, afinal, eram eles a estagnação do mercado fonográfico. O jeito foi procurar por pequenos movimentos culturais que teimavam em aparecer nos mais variados cantos do mundo.

Foi então que a cinzenta Seatlle surgiu, possuidora de uma movimentação musical que, contradições à parte, poderia se tornar o pote de ouro no fim do arco-íris. E se tornou. Não apenas Nirvana, mas Pearl Jam, Mudhoney, Soundgarden, Alice in Chains entre outras tantas bandas saíram de lá conquistando uma legião de fãs que jamais apareceriam nas estatísticas de pesquisa de opinião de qualquer gravadora daquela época. A juventude via o muro cair, a Aids surgir, toda uma nova configuração social se formar, mas ninguém parecia perceber que falar sobre virgens, rituais satânico-farrofas ou mostrar clipes com lobisomens ou trovões já não correspondia mais com os anseios de toda uma massa de pessoas, angustiadas por algo que não sabiam o que era, reprimidas por algo tão desconhecido quanto ao que reprimia. Era preciso um novo guia, um novo ídolo, pois Jim Morrison, assim como Jimi Hendrix ou Janis Joplin já havia morrido ha décadas, e mesmo se estivesse vivos, a luta deles era outra, contra o Vietnã, e não contra esse inimigo invisível que assolava a juventude da década de 1990.

Os ídolos são, por excelência, tão problemáticos quanto seus seguidores. A história de Kurt Cobain cairia como uma luva, afinal, ele era tímido, tinha problemas familiares, de saúde e sua relação com a realidade não mudava uma vírgula do que se via não apenas nos Estados Unidos, mas também no Brasil, por exemplo, que enfrentava a redemocratização de maneira desastrosa. Não havia dúvidas de que Cobain seria a voz que guiaria esta juventude, entretanto, mesmo sendo um movimento premeditado, nem os engravatados das gravadoras podiam prever o que estava para acontecer. Na realidade, temos em "Nevermind" dois lados de uma mesma moeda, que não apenas gera discussões infindáveis, mas que caracteriza a adaptação forçada de uma realidade.

Se o Nirvana foi ou não a melhor banda dos anos 90, nunca saberemos, da mesma maneira que nunca chegaremos ao consenso de quem foi melhor: Beatles ou Rolling Stones. O fato é que Nevermind trouxe de maneira definitiva o underground ao mainstream, causando uma confusão em ambas as regiões. É claro, por exemplo, que as guitarras de Nevermind são distorcidas de maneira diferente das guitarras de “Bleach”, e não apenas devido ao gosto pessoal de Cobain. Elas fazem parte de um apanhado de alteração pelas quais passaram o som da banda ao, teoricamente, subirem um degrau. Tal fato não simboliza venda de ideais e/ou qualquer outro tipo de perda da essencial que move as paixões musicais, mas apenas a adaptação pela qual teve que passa o underground quando adentrou os caminhos do mainstream. Da mesma maneira que colocar nas capas das revistas, abrir programas de televisão e canais das rádios para a inconstância do underground e das pessoas que faziam parte dele também foi uma adaptação pela qual teve que passar o mainstream. A pista é de duas mãos. O mercado precisava de alguém que desse fim na estagnação, e encontrou, mas teve que arcar com esse mesmo alguém evidenciando várias das angústias que, até certo ponto, não são tão boas assim para o próprio mercado.

Se as guitarras de "Smells Like Teen Spirit" rendiam milhares a Geffen, então gravadora da banda, ao mesmo tempo ela expunha em seu refrão, "Here we are now/ entertain us" (algo como "Aqui estamos, entretenha-nos"), a superficialidade da relação juventude/mercado fonográfico: 'já que estamos fudidos, nos dê algo para matar o tempo, pois não há mais nada como aqueles idos anos 70 nos quais eu nem era nascido'. E não pensem ser o Nirvana esse 'algo'. Muito pelo contrário, ele era a voz desta juventude. Assim como era a voz mentirosa da juventude jurando não ter uma arma, pois a escondia por não saber para onde apontar, como no refrão de "Come as you are"; assim como era a voz da juventude repetindo consigo que 'precisava achar uma saída, uma saída melhor, melhor esperar' ("Territorial Pissings"); assim como a voz da juventude premeditando sombriamente que 'alguma coisa estava a caminho' ("Something in the way").

Dessa maneira, "Nevermind" talvez figure entre os discos mais importantes da década de noventa, pois, além de transformar toda uma realidade, alterando relações sociais ou comerciais, retrata a realidade daquela época como poucas outras obras conseguiram fazer. E, independente dos 10 milhões ou dos dez fãs, o importante é que aqueles dez anos estão ali, naquelas doze faixas, como uma fotografia capaz de não apenas mostrar a imagem, mas, principalmente, transmitir a emoção.

domingo, janeiro 16, 2005

Especial - Série Cinema

Vários - Lost in Translation (2003 - trilha sonora)



Quando gostamos de um filme é quase inevitável gostarmos de sua trilha sonora, mesmo que esta não contenha nada de especial. Quantas não foram as músicas que entraram em sua lista de músicas especiais, pois estavam naquele filme que, com certeza, está em sua lista de filmes especiais? Muitas, aposto. Como também aposto que poucas vezes aquele CD de trilha sonora chamou sua atenção nas prateleiras, mesmo quando em promoção. Há, sim, aquelas músicas marcantes, mas quase nunca são capazes de combater aquele raciocínio no qual são encontradas várias justificativas que convencem ser o preço muito acima do que pagaríamos numa trilha sonora.

Acontece que para toda regra existe uma exceção. E, em se tratando de trilhas sonoras, uma exceção pode garantir um dos melhores CDs do gênero no ano. Presente em dez de cada dez listas de melhores filmes de 2004, "Lost in Translation" ("Encontros e Desencontros"), de Sofia Coppola, não apenas merece as honras de melhor filme do ano, mas de melhor trilha sonora também. Sobre o filme, tenho a mesma sensação que Holden Caulfield, de "O apanhador no Campo de centeio", quando lê um bom livro: querer ser amigo do autor. No caso, queria ser amigo da Sofia. Não apenas pelo filme, ou pela escolha de Bill Murray, ou pela sutileza com a qual conta uma história como a do filme, mas por ter colocado em um mesmo disco (e filme) "Jesus and Mary Chain", "My Bloody Valentine", o próprio "Kevin Shields" solo, e outras tantas pessoas legais que raciocínio nenhum seria capaz de me livrar da trilha sonora de "Lost in Translation".

A história pode parecer clichê, afinal, o quê poderia render o encontro de uma garota na crise dos vinte com um homem na crise da meia idade em Tóquio? Por isso, o ponto a ser observado não é a história que está sendo contada, mas como ela é contada, e aqui, "Lost in Translation" se transforma num filme apaixonante. Para aficionados por música, o estrago é ainda maior. A atmosfera na qual se desenvolve o filme, muito embora não pareça, deve muito às canções que vão sendo inseridas ao longo da película, mesmo sendo muitas delas utilizadas apenas para preencher espaços sem diálogos. O filme é equilibrado em todos os aspectos, de tal maneira que se, por ventura, algumas das músicas escolhidas não pudesse ser utilizada, teríamos um desfalque considerável. É claro que tudo ficou mais fácil por não serem figurões da música mundial escalados para esta trilha, entretanto, é pelo mesmo motivo que as músicas se adaptam ao filme de maneira tão fácil.

"My Bloody Valentine" é uma das bandas mais conhecidas do mundo alternativo. Liderada por Kevin Shields, a banda guarda em si uma das histórias mais míticas da história do pop britânico, seja pelas bandas que influenciou ou pelo terceiro disco que nunca foi lançado. Fato é que, depois de pequenas contribuições nos trabalhos de Primal Scream e Mogwai, Shields - o responsável por nunca ter terminado as guitarras do terceiro disco, impedindo, assim, seu lançamento - colaborou com a trilha de "Lost in Translation" com nada menos do que quatro canções ("City Girl", "Goodbye", "Ikebana" e "Are You Awake?"), além de "Sometimes", música do disco "Loveless" de 1991 do "My Bloody Valentine". Ou seja, só por este motivo a trilha já é indispensável, mas não pára por aqui.

"Alone in Kyoto", do dueto Francês Air, é uma das melhores faixas instrumentais que fazem parte deste disco. Apesar de não surpreender em nada, pois a trilha de "The Virgin Suicides", primeiro longa dirigido por Sofia, foi feita inteiramente pelo Air, o dueto mostra por qual motivo é um dos preferidos de Coppola. Há também "Girl", do Death in Vegas, um projeto de estúdio criado por Richard Fearless que já esteve ao lado de nomes como Chemical Brothers; "Too Young" da banda francesa Phoenix está, com certeza, entre as melhores músicas não só deste disco, mas do filme também. O golpe final é a última faixa: "Just Like Honey", da cultuada banda de Glasgow "The Jesus and Mary Chain". Quando formada em meados da década de 1980 pelos irmãos Reid, a banda prometeu, mas estourou no que diz respeito ao público. Entretanto, se tornou em lenda no meio alternativo, influenciando toda uma geração da música britânica e mundial.

"Lost in Translation", caso fosse eu um daqueles loucos por listas de melhores do ano, com certeza estaria em primeiro lugar dos filmes lançados ano passado. Já sua trilha sonora, não apenas por seus nomes, mas principalmente por sua qualidade, está agora entre meus discos favoritos. E não houve raciocínio que me fizesse mudar de idéia. Muito pelo contrário, não há raciocínio que resista frente a um disco como este. Isto, é claro, sem contar a surpresa que vem minutos após o término da última faixa.

(Ainda não assistiu ao filme? Então corra a uma locadora e pegue o DVD, pois o bônus vale o preço da locação. Mas, antes de sair da frente do computador, dê um pulo no WideScreen e entenda por quais motivos os Coppolas acumulam estatuetas do Oscar.)

sábado, janeiro 15, 2005

Maquinário pela internet

* Saiu no Poppy Corn a resenha do disco "Todos os Versos", de Maurício Negão. No fim, há um entrevista com o próprio. Vale a pena;

* O Poppy Corn publicou também a resenha de "How to desmantle an atomic bomb", o novo do U2, que saiu aqui no Maquinário em 12/04.

* Tanto a resenha de "Bleach", que está logo abaixo, como o restante da discografia do Nirvana, será publicada aqui no Maquinário e no site Whiplash.

quarta-feira, janeiro 12, 2005

Extra:

Nirvana - "Bleach" (1989)



Como quase todos os primeiros álbuns, "Bleach", do Nirvana, não poderia ser diferente: cru, energético, sincero, essencial. A grande maioria dos primeiros álbuns, principalmente de bandas que tiveram o punk como inspiração, possuem esta sinceridade, desde sua arte nas capas e encartes até suas músicas. É certo que muita coisa saiu como saiu por falta de possibilidade, entretanto, o essencial de uma banda não seria visível caso não fosse modelado assim. Os primeiros disco são, na maioria das vezes, uma prévia do que podemos esperar pela frente. É claro, muitas vezes somos surpreendidos pelo futuro, mas pode apostar que muitas características que marcam grandes discos de estréia estarão no desenvolver da carreira.

Acusados pela revista Rolling Stone de deflagrarem a revolução punk de 1991, o Nirvana só conheceu o fantasma que aterrorizou Kurt até o último de seus dias chamado sucesso após o lançamento de seu segundo álbum, o rodado Nevermind. Mas como toda história tem um começo e Lobato não foi muito com a cara do expressionismo de Malfatti numa primeira vista, existe "Bleach", o primeiro disco do Nirvana: motivo de estranheza para fãs menos despreocupados, nascimento de um movimento, para fãs mais fervorosos. Segurando o pêndulo, "Bleach" é o Nirvana em fase germinal, afoito pela chance dada pela Sub Pop, mas sem saber ao certo para onde correr.

A primeira coisa que chama a atenção para este disco é o como a maioria das pessoas chegou a ele. Quebrando a regra cronológica, mas seguindo a lógica de mercado, a maioria conheceu o Nirvana através do difundido Nevermind. Na verdade, seguindo a lógica do mercado, é bem capaz que nem ficássemos sabendo de "Bleach" se Nevermind não fosse o que foi. Independente do que poderia ou não ter sido, fato é que após setembro de 1991, Seattle e todo o movimento grunge surge no mapa mundial da música. Nova revolução punk talvez seja exagero, mas que ocorreram grandes mudanças no cenário musical, isto sim é inegável. Michael Jackson e Madonna dominavam o que era conhecido como música pop ao redor do mundo. Isso até aparecer uns caras que se vestiam comumente, não se importavam muito com o número de toalhas brancas no camarim e quebravam o palco inteiro. Tudo isso, é claro, após um show que distribuía gritos, microfonias e o desabafo de toda uma juventude angustiada por não saber para onde ir. Sim, havia toda uma produção por trás disso, e sim, havia grandes gravadoras que distribuíam singles para grandes rádios. Mas antes de sair por aí perguntado que merda de revolução punk é essa, não se esqueça de um tal de Malcolm McLarem, o cara que juntou alguns outros caras que não sabiam direito o que estava acontecendo, pois estava claro que dali sairia dinheiro. Então, antes de dizer que 1977 foi o ano, analise a situação como um todo.

Voltando a 1989, "Bleach" é recheado não apenas de boas músicas, mas também (e principalmente) lendas, pois todo primeiro disco é cheio delas. A primeira delas diz respeito ao título do álbum. Ao pé da letra, a tradução seria "alvejante", mas conforme rezam alguns, "Bleach" veio de uma campanha para que usuários de drogas injetáveis desinfetassem as agulhas, a fim de evitar a Aids. O slogan dessa tal campanha era "Bleach your work". Outra história que ronda a estréia do Nirvana é o fato de Jason Everman, creditado como guitarrista no disco, não ter gravado uma só nota, mas apenas patrocinado os famosos U$606,17 da produção do disco. De qualquer maneira, o cara com uma guitarra no canto direito da capa é o próprio, e mesmo que não tenha participado musicalmente do disco, ele está gravado na história da banda, assim como Tracy Marander, possível responsável pela foto da capa, namorada de Cobain no início de sua carreira e a 'girl', de "About a girl". Para terminar a seção curiosidades, o disco deveria se chamar "Too many humans", mas por algum motivo, acabou ficando "Bleach" mesmo.

Gravado em dois meses, "Bleach" dá um bom retorno ao selo, vendendo pouco mais de trinta mil cópias. E não é para menos: "Bleach" não bate Nevermind, é claro, mas é uma peça fundamental na coleção de quem gosta de música. Não só por seu valor histórico, mas por sua qualidade musical. Um disco cru, guitarras de riffs marcantes, que deixam claras a influências do punk e do metal setentista, como Black Sabbath, por exemplo, no som da banda. Os vocais de Cobain, desde já chamam a atenção, seja por seus berros peculiares, ou pela sinceridade transmitida em momentos de total êxtase como em "Negative Creep" ou na calmaria dos primeiros versos de "About a girl". Mesmo Kurt dizendo que as letras foram feitas às pressas, "só para ter o que cantar", como respondeu em várias entrevistas, notamos aqui uma das características mais marcantes de Cobain como compositor: letras auto-biograficas com pesada carga emocional. Prova disso é freudiana "Floyd the Baber", onde fica clara a aversão que Kurt tem por sua cidade natal, Aberdeen, ou a sensível "About a girl", um pedido de desculpas, como dito acima, dedicado a sua então namorada Tracy Marander.

Muito embora "Bleach" tenha sido gravado as pedaços - "Floyd the barber", "Papers cuts", "Love buzz" e "Big Cheese" foram gravadas como compactos, sendo aproveitadas no álbum -, o disco é consistente, deixando transparecer uma certa coerência no som da banda. Ou seja, as canções, mesmo gravadas separadamente, eram claramente da mesma banda, e poderiam estar num mesmo disco, fato que acabou ocorrendo. Algumas dessas canções provaram sua resistência a grandes sucessos permanecendo no set-list da banda mesmo após anos de seu lançamento. Não por acaso "Blew", "About a girl" ou "Negative creep" constaram nos últimos shows da banda, sendo que "About a girl" abre o MTV Unplugged, última aparição televisiva do grupo de Seatlle. Uma característica marcante das composições deste primeiro disco é que antes dos arranjos extremamente grudentos de Nervermind, "Bleach" - que também possui arranjos grudentos, mas não como seu sucessor - mostra um Nirvana mais experimental, mais pesado, ou, como dizem alguns, "mais verdadeiro". "Blew", "Papers cuts" e "Big cheese" talvez sejam os melhores exemplos para isto.

Só mais uma curiosidade: o primeiro single da banda foi "Love Buzz", uma música no mínimo curiosa. Não por sua letra nem por seu arranjo, mas por sua origem: esta música é de um grupo holandês desconhecido da maioria das pessoas chamado "Shocking Blue". Além de cortar metade da letra, o Nirvana reinventou a música com guitarras distorcidas, mas mantendo a base como era originalmente. Servindo até como metáfora, a reinvenção deste primeiro single coincide também com uma séria de reinvenções pelas quais passaram a banda neste período inicial de sua carreira. Foi durante a turnê de "Bleach" que a banda começou a ter problemas com sua formação. Muitos (mesmo) bateristas passaram pelo Nirvana até fixarem aquele que gravaria “Bleach” e seria proprietáriodas baquetas: Chad Channing. Entretanto, quando começaram os shows pós-Sub Pop, Channing já não estava agradando muito. Retirado da banda, alguns outros como Dale Crover, do Melvins ou Dan Peter, do Mudhoney passaram por ali, mas apenas em meados de 1990, Dave Grohl assume definitivamente a bateria do Nirvana, deixando para trás sua banda, o Scream.

Formação fechada, novo empresário, turnê, músicas novas, gravações e um contrato com a DGC, da gravadora Geffen. A partir daqui vemos nascer o tão falado/aclamado/etc/etc "Nevermind", segundo álbum da banda, aquele mudaria o cenário mundial da música. Daqui para frente a história já foi contada milhares de vezes, porém, para quem - como Gregório de Matos - acredita que o todo sem a parte não é todo -, "Bleach" está aí para mostrar o começo desta revolução que já conhecemos.

domingo, janeiro 09, 2005

Esta semana:

Skank - Radiola (2004)



O Skank é uma das bandas que melhor marca o cenário pop da música brasileira da década de noventa. Passada a onda "anos oitenta", era preciso que ocorresse uma reformulação, o surgimento de novos rostos, mesmo que o som não fosse tão diferente assim. Neste recorte, duas bandas surgem: Patu Fu e Skank. E estas guardam em si uma característica que já não mais faz parte da realidade fonográfica brasileira. Remontando a carreira dos dois grupos, vemos que seus primeiros trabalhos ("Rotomusic de Liquidificapum" e "Skank"), ambos lançados em 1993, não foram grandes sucessos, pois não era necessário. Parece mentira, mas houve uma época em que as gravadoras investiam na carreira do artista, e não apenas nos sucessos imediatos como temos hoje.

Os tempos são outros, estas duas bandas - hoje com mais de dez anos - têm carreiras sólidas, respeito e um nome já grafado na história da música popular brasileira. É claro, como acontece em todo o universo, os discos de inéditas começam a abrir espaço a lançamentos no formato "ao vivo" e coletâneas, o quê não é de todo mal, afinal, é uma forma de conhecer o grupo no conjunto de sua obra. Entretanto, se mal utilizada tal ferramenta, o artista tende a perder a confiabilidade que construiu ao longo de seus dez, vinte anos de carreira, e, como sabem, não são poucos os exemplos que ilustram bem esse fato. As duas bandas em questão contam com discos ao vivo em sua discografia. Bons discos, por sinal, e lançados em períodos pertinentes - "MTV Ao vivo Skank" em 2001 e "MTV Ao Vivo Pato Fu" em 2002: chegando aos dez anos de carreira, um disco ao vivo é a possibilidade de revisitar algumas velhas músicas e dar uma nova roupagem (fato bem explorado pelo Pato Fu), além de mostrar aos fãs mais novos e preguiçosos como começou toda aquela história que está no palco. O ponto é que até agora nenhuma destas bandas havia lançado uma coletânea, que também uma possibilidade de revisitar a carreira e se apresentar a novos fãs, mas seguramente perigosa se comparada a um disco ao vivo. A primeira a se render ao formato foi o Skank, com o lançamento de "Radiola" em Novembro deste ano.

O primeiro perigo de se lançar uma coletânea passou longe de "Radiola": este é o oitavo disco da banda. De certa maneira, já estava na hora de sair um disco que fizesse um panorama geral da carreira do grupo. Segundo, é provável que não desagrade os fãs mais recentes da banda, e nem os mais velhos. Alguns poderiam apontar como tropeço de "Radiola" dar preferência aos trabalhos anteriores mais recentes do grupo ("Maquinarama" e "Cosmotron"). Acontece que os grandes sucessos dos primeiros discos do grupo ("Jackie Tequila", "Resposta" ou "Garota Nacional", por exemplo) já estão no disco ao vivo de 2001, portanto, o tropeço seria colocá-los novamente neste recém lançado trabalho da banda. Em suma, "Radiola" é uma coletânea bem estruturada não apenas em si, mas no contexto histórico da banda.

Se por um lado não há os sucessos dos primeiros discos da banda, por outro, esta coletânea traz quase todos os últimos hits do Skank. Logicamente dividido, "Radiola" traz quatro músicas de "Maquinarama" (2000) - "Três Lados", "Balada do Amor Inabalável", "Ali" e "Canção Noturna"; quatro músicas de "Cosmotron" (2003) - a tocadíssima "Vou deixar", as baladas "Amores imperfeitos", "Dois Rios" e "Formato mínimo". Ou seja, três grandes hits e duas não tão conhecidas assim ("Ali" e "Formato Mínimo") de cada álbum, inteligentemente inseridas para mostrar que "Maquinarama" e "Cosmotron" vão muito além das músicas radiofonicamente abusadas. Uma boa sacada da banda para fisgar aqueles que não vão muito além do que é tocado nas rádios país à fora.

Esta coletânea ainda conta com quatro músicas inéditas. A primeira e que abre o disco é "Um Mais Um", parceria de Samuel Rosa e Rodrigo Leão que acabou gerando uma psicodelia pop que esquentará muitos luaus verão de 2005. "Vamos Fugir", regravação de Gilberto Gil, é a segunda inédita, gravada especialmente para um comercial de sandálias, está em qualquer top das FMs as última semana. "Onde estão" é mais uma pareceria de Samuel Rosa, desta vez com Nando Reis. Balada voz e violão que também estará nos luaus acima citados. Fechando o disco, está a curiosa versão de "I Want You", de Bob Dylan, gravada para um tributo a Dylan que nunca saiu do papel. Esta versão chama a atenção pois em "Skank", de 1993, temos a música "Tanto", também uma versão para esta música, mas cantada em português. Vale a pena compara-la não só entre as versões do Skank, mas também com a de Dylan, afinal, este nunca é demais.

"Radiola", se comparado a outras tantas coletâneas, é um bom disco. Lançado no momento certo da carreira da banda, é capaz de fazer um retrospecto não só evitando o Skank de cair no erro de lançar vários discos com mesmas músicas, mas principalmente tentando retratar, ao lado dos sucessos, as músicas pouco difundidas que também fazem parte dos trabalhos. Essa onda de sucessos instantâneos acaba deixando boas canções para trás, é o preço do mercado, E somos nós quem pagamos. Teorias mercadológicas à parte, a torcida se volta agora ao Patu Fu, pois o Skank cumpriu bem este novo passo de sua carreira.

* Resenha publicada no site Poppy Corn

domingo, janeiro 02, 2005

Esta semana:

Fluid - Mama hates (2004)



O Fluid já passou aqui pelo Maquinário com o seu primeiro CD, "Songs from my apartament", lançado em julho de 2003. E agora eles estão de volta como um novo trabalho, o EP "Mama hates", lançado em julho de 2004.

A principal diferença entre "Mama hates" e "Songs..." está na gravação. Como escrito anteriormente, "Songs..." foi gravado de maneira caseira, na limitação de um computador e uma mesa de quatro canais, enquanto "Mama hates" teve uma produção mais profissional, gravado no estúdio Síncopa (Campinas), com todos os cuidados e detalhes que um estúdio pode proporcionar. Neste novo EP constam quatro canções que já estavam na primeira demo ("Mama hates", "Sex is blind" e "You're sweet" e "Stay"), e duas novas ("Time out" e "Remote control"), que mostram uma faceta até então desconhecida da banda.

De primeira, notamos que as músicas já conhecidas ganharam o peso que precisavam. A qualidade da gravação faz diferença quando comparamos, por exemplo, as duas versões "Stay": já em “Songs...” percebemos que a força da música está no refrão. Entretanto, apenas neste novo trabalho as guitarras ganharam a sustância que uma gravação caseira jamais poderia dar, transformando a música de tal maneira que só ouvindo para entender o nível desta alteração. No que diz respeito as faixas novas, a característica mais marcante é, sem dúvida, os detalhes. E não apenas no que diz respeito a composição, mas também na inserção de novos instrumentos - como vemos em "Remote control", onde o peso das guitarras agora abre espaço também para teclados -, que além de enriquecerem as canções, abrem um amplo horizonte de possibilidades à banda.

Para falar mais sobre o EP e a banda, o Maquinário entrevistou Pelle, vocalista e guitarrista do Fluid.

Maquinário: Ao ouvir o Ep "Mama hates" e o comparando com "Songs from my apartament" fica claro que a produção em estúdio fez uma grande (e boa) diferença nas músicas. E para a banda, como foi a experiência de entrar em estúdio?
Pelle: Entramos em estúdio num momento meio conturbado, pois, poucos dias antes, os antigos guitarrista e baixista saíram da banda (hoje estamos com o Dinho no baixo e o Juninho na guitarra). Daí fomos apenas eu e o Dú (baterista) para o estúdio e lá contamos com a força da galera do Sincopa que ajudou bastante na finalização do EP. Mas, tirando esse contratempo, foi muito bom entrar em estúdio porque deu para colocar no cd aquilo que é mais a cara da banda. Em casa, devido aos recursos precários, às vezes a gente não consegue colocar toda a força e detalhes dos arranjos como efetivamente gostaríamos.

M: Não só nos shows, mas também através da demo, percebemos que o Fluid possui várias composição próprias. Como foram escolhidas as faixas que entrariam no novo EP?
Pelle: Pegamos as músicas da primeira demo que tinham mais a cara da banda e que, para nós, estavam “finalizadas” (no sentido de haver menos chance de aparecerem futuras modificações nos arranjos etc). Mas não queríamos apenas repetir músicas anteriores. Tínhamos que colocar algo novo pra quem já tinha o ‘Songs...’. Tínhamos algumas músicas novas e resolvemos pegar “Remote Control” e “Time out”, porque, apesar de não estarem na outra demo, a gente já tocava essas músicas fazia algum tempo.

M: Sobre as músicas novas. Elas, se comparadas ao restante do CD ou mesmo ao "Songs...", são mais trabalhadas, mostrando um outro lado da banda onde melodias são bem valorizadas e os arranjos mais complexos. Isso demonstra um amadurecimento ou apenas a exposição de um outro lado da banda que não conhecíamos?
Pelle: Acho que um pouco dos dois, mas eu diria que é mais um outro lado da banda que não tinha aparecido na primeira demo (talvez até, como eu disse antes, por causa dos recursos precários). Gostamos de ter no repertório essa variação de músicas mais diretas e cruas com algo mais complexo, principalmente em termos de arranjos e melodias.

M: Os projetos futuros tendem a seguir esse caminho mais trabalhado ou vocês manterão o lado mais pesado como vemos em "Stay", por exemplo?
Pelle: Como eu disse antes, gostamos dessa variedade. Achamos que ela funciona bem nas apresentações ao vivo. Como intenção, não tenho muita vontade de fazer músicas com mais de 5:00 min, como é o caso de “Remote Control”, apesar de eu achar, é verdade, que isso não depende exatamente de querer ou não (às vezes a música acaba necessitando de um tempo de duração maior para fazer sentido), mas certamente não ficaremos só no lado cru da banda.

M: Há também o contrato com uma produtora norte-americana. Em relação a eles, quais são os planos futuros da banda?
Pelle: Cara, as expectativas são excelentes! Os planos são de no ano que vem nós passarmos 5 meses nos EUA tocando na costa leste (3 meses) e depois na oeste (2 meses). Tem previsão de lançamento de single (Mama Hates) em Janeiro; de Maxi-Single (que é esse EP com 6 músicas intitulado ´Mama Hates´) em Fevereiro; de lançamento do cd (provavelmente com 12 músicas) em Março; dando início a tour em abril de 2005. No papel, tá lindo...!!! Mas eu tenho que ver pra crer... vamos esperar.

M: E os planos da banda?
Pelle: Estamos tentando fazer nossa parte por aqui pelo Brasil também, lógico. Gravamos um demo-clipe para ‘Mama Hates’ que deve ficar pronto até o final desse mês (Novembro de 2004). Temos nosso cd que está com uma qualidade (acho eu) legal. Nosso site (http://www.fluidband.com.br/) está no ar (apesar de ainda estar meio porco rs!) e já está sendo melhorado, devendo ficar muito interessante. O difícil mesmo é tocar por aqui. Isso é impressionante! Tem panela pra tudo que é lado, rapá!! Então, mesmo fazendo um trabalho bacana, se você não conhece fulano, não rola! Se o tal fulano não vai muita com a sua cara então...(na maioria das vezes sem nem te conhecer ou sequer ter escutado sem som...)! Daí fode de vez! rsrs! Mas, dentro das nossas condições, que são sempre totalmente guerrilheiras (como foi o agendamento de todos os lugares que já tocamos, a gravação do cd, do clip etc), temos tocado em alguns lugares por aí e temos conseguido distribuir bastante cds. A galera tem gostado e isso é bem legal de se ver. Tem um pessoal da Bahia (galera dos Honkers) que nós estamos bem ligados e talvez apareça alguma coisa prá nós tocarmos fora de SP. No fim das contas, parece que vai ser mais fácil tocar nos EUA ou em outros estados no Brasil do que em SP... rs! Vamos em frente.

sábado, janeiro 01, 2005

Maquinário pela internet

* Saiu a resenha do novo disco do Skank ("Radiola") lá no Poppy Corn. Já viu?